segunda-feira, 30 de abril de 2012

Documento final da II Grande Assembleia das lideranças femininas ( Kuña Aty) Guarani-Kaiowá-MS


DOCUMENTO FINAL DA II KUNÃ ATY GUASU
ALDEIA JAGUAPIRU- DOURADOS- MS
25 A 29 DE ABRIL DE 2012

Nós Mulheres Indígenas Guarani kaiowa e Ñandeva, com a participação de rezadeiras, parteiras, artesãs, agentes de saúde, professoras e demais lideranças de todas os Tekoha (aldeias) do cone sul do Estado do Mato Grosso do Sul, reunidas na II Kunã Aty Guasu - Grande Assembleia de Mulheres Indigenas, realizada na aldeia Jaguapiru - Dourados- MS, nos dias 25 a 29 de abril de 2012, manifestamos, denunciamos e reivindicamos SAUDE E POLÍTICAS PUBLICAS PARA AS MULHERES INDIGENAS de nossos Tekoha.  

Unidas a todos os povos indígenas do Brasil na grande Mobilização Nacional, manifestamos nosso repúdio com a aprovação da PEC 215. Queremos dizer a todos nossos parentes que estamos na mesma luta e não desistiremos de nossos TERRITÓRIOS TRADICIONAIS.

Nós, Mulheres Indígenas, viemos a público manifestar nossa indignação!

Vivemos hoje em nossas aldeias um quadro de violência e marginalidade. Nossas crianças sofrendo desnutrição; nossos jovens sem direito a uma educação diferenciada e de qualidade, sem perspectiva de vida e de futuro, condenados ao suicídio e às drogas; nossas mulheres sofrendo toda sorte de descaso na saúde, enfrentando por meses e anos as numéricas filas sem serem atendidas pela SESAI, sem resultados. Sofrendo toda sorte de discriminação, violência doméstica, desprezadas e esquecidas por nossas autoridades e instituições governamentais em estado de sucateamento e corrupção. Enquanto o agronegócio cresce e cresce, invadindo nossas terras. “Poluíram nossos rios, destruíram nossas matas, nossa farmácia e nossa saúde. Destruiram nossa cultura, nosso tekoha, nossa vida e nossa dignidade, deixando nossas mulheres a mercê das rodovias, dos acampamentos e pequenas áreas, insuficientes para nossa sustentabilidade.” Além disso, somos nós mulheres, que mais sofremos as conseqüências dessa estrutura injusta que gera violência e morte em nossas famílias e nossos Tekoha.

Nós, Mulheres Indígenas, queremos de volta nossos direitos!
Exigimos:

  1. A urgente identificação e demarcação de nossas terras, como condição para diminuir a fome, a dependência e violência em nossos Tekoha. Reforçamos as propostas assumidas  no documento da Aty Guasu de Jaguapire nos dias 29 de fevereiro a 04 de março.
  2. Garantia de participação das mulheres e do Conselho do Aty Kunã nas instancias de controle social, bem como na concepção, construção e implementação de programas e ações governamentais voltados para nossos Tekoha ;
  3. O reconhecimento, fortalecimento de nossas práticas tradicionais, seja medicinal, religiosa, cultural e de produção alimentar voltadas para autonomia e auto afirmação de nossos Tekoha; 

Segurança para as Mulheres em nossas aldeias e acampamentos

  1. A Delegacia da Mulher funcione por período integral, inclusive aos finais de semana e feriado e atendimento diferenciado, respeitando a diversidade da língua e da cultura da mulher indígena;
  2. Criação e implementação de um centro de atendimento para a mulher indígena na aldeia Jaguapiru-Dourados.
  3. Sejam efetivadas e reforçadas os programas de segurança dentro das aldeias com especial atenção a mulher indígena, garantido o plantão de atendimento à noite e finais de semana.
  4. Sejam implementadas e efetivadas políticas específicas e diferenciadas bem como a promoção de programas de prevenção e combate a violência e descriminação contra a mulher indígena.
  5. Sejam criados, implementados e efetivados programas de capacitação de servidores (as) públicos(as) em gênero, cultura  e direitos humanos, de forma a garantir o direito à diversidade de língua e cultura das mulheres indígenas.

Saúde diferenciada e de qualidade e para a mulher indígena

  1. Que haja melhoria da qualidade de atendimento à população indígena em geral e em particular à mulher indígena. Que a SESAI assume sua responsabilidade e que o atendimento chegue às bases com qualidade e agilidade. “Estamos cansadas e ver nossas companheiras morrendo nas filas dos postos de saúde!”
  2.  Sejam criados, implementados e efetivados programas de capacitação em gênero, língua e direitos humanos aos agentes e demais profissionais da saúde de forma a garantir um atendimento humanizado e diferenciado às mulheres indígenas.
  3.  Sejam estabelecidos postos de saúde nos acampamentos tendo assegurados sua estrutura de recursos humanos, material e saneamento básico.
  4.  Implantação e implementação de mecanismos adequados de efetivo monitoramento e avaliação dos impactos ambientais dos projetos de monocultura e uso indiscriminado de agrotóxicos que atingem diretamente nossas aldeias causando intoxicações, envenenamentos e mortes.
  5. O acesso à água de qualidade é um direito humano básico. Garantir o acesso à água de qualidade e em quantidade suficiente em nossas aldeias (atenção especial a aldeia Bororó- Dourados).
  6. Criaçao de CAP’s, CREAS, CRAS e Posto de Saúde na aldeia Jaguapiru- Dourados, de modo a responder a demanda.
  7.  Que a SESAI planeje a compra de ambulância pra os postos de saúde que atenda as aldeias em tempo integral.

Sustentabilidade e Segurança Alimentar

  1. Garantir a implementação e efetivação de Políticas Públicas de Incentivo à produção sustentável de alimentos e outros gêneros necessários à nossa reprodução física e cultural, respeitando a diversidade de modos de produção tradicional em diálogo com outros saberes ecologicamente sustentáveis;
  2.  Garantir a recuperação das áreas degradadas, matas ciliares e implementar medidas compensatórias e indenizatórias pelos danos causados aos nossos territórios tradicionais;
  3. Implementar programas que fomentem o uso livre e autônomo das sementes crioulas ou tradicionais e que favoreçam a multiplicação de experiências como casas de sementes, bancos de sementes e outras desenvolvidas pelas comunidades indígenas.
  4. Que sejam priorizadas e garantidas programas de sustentabilidade e produção de alimentos nas áreas retomadas;


Considerando que as proposições acima são parte de nossos direitos constitucionais, solicitamos às autoridades competentes a garantia de sua implementação como reparação dos processos históricos de exclusão, violência e discriminação contra nosso povo.

Reafirmamos nossa disposição de consolidar nossa organização e articulação do Movimento de Mulheres Kaiowá Guarani e Ñandeva, somando com nossos companheiros na luta pela nossa terra e garantia de nossos direitos, construindo um país plural, mais justo e solidário.

Aldeia Jaguapiru - Dourados, 28 de Abril de 2012

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