História Aty Guasu

Tonico Benites-Guarani-Kaiowá e pesquisador da UFRJ

História da invasão do território Guarani Kaiowá

Tekoha Guasu Guarani e Kaiowá, 18 de dezembro de 2012.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Relatório da diligência do conselho da Aty Guasu


Comissão da Aty Guasu Guarani-Kaiowá-MS
Relatório da visita às comunidades guarani-kaiowá dos territórios reocupados em conflito, localizados no cone sul de MS, na faixa de fronteira entre Brasil e Paraguai.

Período de visitação/diligência: 17/02 a 22/02/2012Objetivo de visitação/diligência: Nós integrantes da comissão de Aty Guasuencarregada de realizar acompanhamento e levantamento in loco das situações dosnossos parentes Guarani-Kaiowá das áreas reocupadas em conflito, apesar de todas asnossas dificuldades, tais como: sem recursos, sem apoio nenhum, etc, estivemos emdiligência aos territórios tradicionais reocupados que se encontram em conflito intensono cone sul de Mato Grosso do Sul. Um dos nossos objetivos, como porta-vozes da AtyGuasu, é ouvir e ver diretamente os integrantes das comunidades pertencentes às partesdos territórios em conflito. Somente com a proteção divina da ñadejara ypy (deuses) não aconteceu nada de ruim conosco durante a visitação e conseguimos com êxitoreceber as informações diversas das lideranças que se tornarão como as pautas de debatena Aty Guasu/2012. Além disso, levamos a mensagem aos parentes que haverá atyguasu em Terra Indígena Jaguapiré-Tacuru-MS onde serão apresentadas e socializadasas nossas demandas e reivindicações às autoridades competentes, buscando as soluções possíveis para nossas demandas atuais.Assim, pretendemos através deste relatório reproduzir e destacar alguns relatos daslideranças dos territórios em conflitos (Kurusu Amba, Ypo’i, Pyelito kue, Mbarakay,Yvy Katu, Sombrerito, Guaiviry, entre outros.).A maioria das lideranças narraram que na pequena parte reocupada (Pyelito kue eYpo’i, Kurusu Amba, etc) dos territórios tradicionais tekoha guasu onde se encontra em manifestação/protesto contínuo, ali eles recebem frequentemente os ataque cruéis e ameaças de variadas formas:

“à noite fazem tiros nas redondezas dos nossos acampamentos,chegaram ao acampamento procurando identificar nossas lideranças e ameaçando de morte, soltaram gados no acampamento para nos dispersar, botou fogo no capim ao próximo do acampamento Pyelito kue para nos criminalizar”. Em geral, os pistoleiros estão cercando e isolando as áreas reocupadas, não deixando perambular os indígenas.

“Pela estrada vicinal há pistoleiros de motos e carros especiais ameaçando-nos.” “Em torno do nosso acampamento, dia e noite há pistoleiros de cavalo e motoqueiro também”. Contaram lideranças de Pyelito kue-Mbarakay e Kurusu Amba. “Aqui nos acampamentos há crianças-alunas, porém, não há saída para criançadas irem frequentar a escola por conta do impedimento dos pistoleiros das fazendas”. Queríamos a sala de aula/escola aqui na área.“Aqui não chega a equipe da saúde, os pistoleiros não deixa”. “Aqui no acampamento, nós todos daqui, várias vezes, já passamos fome, doente. a FUNAI demora em entregar alguns alimentos”. “Apesar de todas as ameaças e misérias em que vivemos aqui dia-a-dia, porém nós não vamos desistir em luta pela nossa terra antiga.” “Vamos aguardar aqui no acampamento a demarcação de nosso tekoha guasu”. Assim, narraram lideranças guarani-kaiowá do tekoha Pyelito kue-Mbarakay, Ypo’i, Kurusu Amba.

Um dos temas preocupantes e graves (no que diz respeito à área de assistência à saúde indígena) foi socializado entre lideranças de tekoha Yvy Katu e Sombrerito, KurusuAmba, Potrero Guasu. Comentaram que algumas pessoas indígenas do acampamento em conflito (Sombrerito, Pyelito kue, Potrero Guasu) que foram encaminhados aos hospitais, retornaram ao acampamento já sem vida ou morto. 

Por exemplo:
“De tekoha Sombrerito uma mulher indígena pós-parto tradicional foi encaminhado ao hospital junto com bebê, algum dias depois, ela foi entregue aos parentes já sem vida. "Foi um susto e medo” disse líder indígena. Em geral, os integrantes guarani-kaiowá das áreas reocupadas não são atendidos pela equipe de saúde, quando os atenderam, muitas vezes atendem de modo inadequados,gerando surpresas e constrangimentos nas lideranças e parentes dos acampamentos.

“No final de 2011, o kaiowá Rosalino Lopes ferido pelos pistoleiros em Pyelito kue morreu sem atendimento médico”. “Em Kurusu Amba morreram 03 crianças por falta de atendimentos da equipe de saúde

Lembraram as lideranças.Um dos assuntos grave foi socializado pela liderança de Kurusu Amba, “uma parente indígena da aldeia Takuapiry faleceu no hospital e foi entregue aos parentes e famílias o corpo tudo cortado ou dilacerado, ao longo do peito e barriga teve corte e tripa e pulmões foram retirados do corpo”.

No que diz respeito à equipe de saúde indígena da FUNASA/DESAI: a liderança de tekoha Potrero Guasu narrou que ele teve desentendimento com um dos conselheiros da equipe da saúde indígena local, em Paranhos-MS. Ele como liderança da área reocupada Potrero Guasu denunciou a equipe da saúde local, após morte de um indígena por falta de atendimento da equipe de saúde, porém um conselheiro indígena de saúde local contrariou a sua denúncia, defendendo a DESAI. Visto que o conselheiro de saúde indígena é funcionário da DESAI ou equipe de saúde indígena.

“Um meu tio morreu por  falta de medicamento, sobre isso queria falar na reunião em Paranhos, mas fui interrompido,expulso por um conselheiro da equipe de saúde, não deixou eu falar”, tive q sair da reunião onde era tratado o atendimento a saúde indígena”, contou. Ainda observou e disse: “a equipe de saúde e a DESAI e geral deveria mudar a formar de trabalhar e passar a ouvir a liderança do tekoha e Aty Guasu, não ouvir somente o conselheiro dele”.

Diante disso, um dos temas da Aty Guasu será a formar de trabalhar a equipe da DESAI e saúde indígena nas áreas reocupadas. Aguardamos o responsável pela saúde indígena da DESAI e do Ministério da Saúde.Do exposto acima, nós da comissão da Aty Guasu, consideramos que todos os relatos das lideranças das áreas reocupadas serão pautas da Aty Guasu, portanto efetuamos os registros dos fatos constatados durante a nossa visita aos referidos acampamentos indígenas, e por fim submetemos a apreciação de todas as autoridades brasileiras(MPF,SDH, PRESIDENTE DA REPÚBLICA, FUNAI, FUNASA, ETC) para tomar  providências cabíveis e legais.Por último, aproveitamos a oportunidade para reforçar o convite das lideranças guarani-kaiowá a fim de que Vossas Excelências participem da Aty Guasu que haverá entre os dias 01/03/2012 e 03/03/2012 na T. I. Jaguapiré-Tacuru-MS. Estamos à disposição de Vossas Excelências, para os demais esclarecimentos e diálogos.

Atenciosamente, Dourados-MS, 23 de fevereiro de 2012.
Conselho/Comissão de Aty Guasu Guarani-Kaiowá-MS

segunda-feira, 5 de março de 2012

Carta da Aty Guasu enviada ao desembargador da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª TRF/SP


Grande assembleia Aty Guasu Guarani-Kaiowá-MS, 03 de março de 2012
À 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Ref.: Agravo de Instrumento n. 0026974-69.2001.4.03.0000/MS- 2011.03.00026974-4/MS
Excelentíssimo Senhor Desembargador da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Meritíssimo ANTONIO CARLOS CEDENHO,

Nós lideranças Guarani-Kaiowá da grande assembleia Aty Guasu vimos por meio desta apresentar a situação mísera, perplexa e instável permanente de vida de (trinta mil)30.000 Guarani-Kaiowá expulsos dos territórios tradicionais que se encontram em oito (08) Postos Indígenas/aldeias superlotadas criada entre 1915 e 1928 pelo órgão indigenista Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Há 15 mil Guarani-Kaiowá despejados das terras antigas que estão dispersos nas pequenas áreas/acampamentos em conflito, nas margens das rodovias BR e nas periferias das cidades do Cone Sul de MS. De fato, a vida mísera e instável, assassinatos, suicídios e desnutrição que atingem a nova geração Guarani e Kaiowá são o resultado direto de violentas expulsões dos indígenas dos territórios antigos praticadas por pistoleiros das fazendas do atual Cone Sul de MS ao longo das décadas de 1970 e 1980.

Observamos que desde 1990 as ordens de perversos despejos das comunidades Guarani-Kaiowá são promovidas pela primeira instância da Justiça Federal do Mato Grosso do Sul.

Assim, a continuidade de nossa miséria, sofrimento, instabilidade e dispersão cruel de nossas famílias, a tentativa de desligamento de nosso território continua sendo efetuado pela própria Justiça Federal do Mato Grosso do Sul. Dessa forma, fomos levados às reservas/aldeias e margem da rodovia BR onde hoje não há mais espaço de terra para nós sobrevivermos.

Nestas reservas/aldeias não há mais espaço, recursos naturais, mina d’ água, são superlotadas e, por conta desta superlotação, há nelas muita violência. De fato, em decorrência desses vários despejos violentos já resultaram centenas de suicídios, mortes por desnutrição em todas as reservas/aldeias superlotadas. Nestas reservas e na margem da rodovia BR não há como praticar e preservar mais nosso modo de ser e viver Guarani-Kaiowá. Diante disso que muitas famílias Guarani-Kaiowá decidiram e tentaram retornar aos territórios antigos, ocupando pequenas parcelas de terra, com o objetivo de sobreviver culturalmente e para praticar os rituais religiosos e se afastar do mundo de violências das reservas/aldeias superlotadas. Como exemplo temos: As comunidades de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhantes-MS, Takuará-Juti, Kurusu Amba-Cel Sapucaia, Guaiviry-Aral Moreira, Guyra Roka-Caarapó entre outros. Nestes pequenos espaços reocupados por famílias extensas Guarani-Kaiowá, em que ocorre diariamente a prática de rituais religiosos e profanos, os grupos recomeçaram revitalizar as culturas tradicionais que garantem a boa vida futura. Isto não é mais possível nas reservas/aldeias onde as famílias foram sempre despejadas. 

Em geral a ordem de despejo das comunidades Guarani-Kaiowá dos territórios conseguido pelos fazendeiros através da Justiça Federal, em certa medida é a continuidade da expulsão drástica e perversa praticada comumente pelos pistoleiros das fazendas nos anos de 1970. Já vivemos e sentimos que as consequências das ações de despejos tanto pelos pistoleiros das fazendas, quanto pela Justiça, os resultados foram, são e serão extremamente truculentos e nocivos para a nova geração Guarani-Kaiowá.  

Assim, destacamos que a ordem da Justiça Federal em Dourados-MS para despejar através de força policial a comunidade Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu, composta também por crianças, mulheres e idosos, faz parte de um processo sistemático de etnocídio/genocídio, devido a uma história de violências contra povos indígenas brasileiros, alimentando o extermínio total do povo Guarani-Kaiowá do Cone Sul de Mato Grosso do Sul.
Ressaltamos que nos Guarani e Kaiowá temos uma ligação especial com o território, pertencemos à determinada terra. Assim, a terra ocupada por nossos recentes antepassados é vista por nós como uma fundamentação de vida boa, vida em paz, sobretudo é a fonte primária de saúde, bem estar da comunidade e famílias indígenas.  Dessa forma, o nosso território antigo é vital para nossa sobrevivência e desenvolvimento de atividades culturais que permitem a vida boa como um forte sentimento religioso de pertencimento à terra antiga, fundamentada em termos cosmológicos, sob a compreensão de que nos Guarani-Kaiowá fomos destinados, em nossa origem, como humanidade, a viver e a cuidar deste específico território antigo.

Diante disso, vimos através desta carta apresentar os nossos pedidos a Vossa Excelência. Nosso povo Guarani-Kaiowá quer sobreviver fisicamente e culturalmente como povo originário do Brasil. Não queremos ser extintos pela própria ação e mando da Justiça do Brasil. Como primeiro povo indígena do Brasil, queremos ser protegidos pela Justiça brasileira. Não queremos ver mais os nossos parentes serem expulsos dos pequenos espaços em seus territórios tradicionais, aumentando e alimentando mais violências contra o povo Guarani-Kaiowá. Por essa razão, nós lideranças da assembleia do Aty Guasu do povo Guarani Kaiowá do MS solicitamos a permanência da comunidade Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS no pequeno espaço antigo em que está reiniciando uma boa vida, onde está realizando os rituais vitais do povo Guarani-Kaiowá. Além disso, solicitamos a conclusão imediata do relatório antropológico de identificação do território Laranjeira Ñanderu-Rio Brilhante-MS. Visto que esta área é de ocupação tradicional Guarani-Kaiowá, é integrante das terras antigas situadas na bacia do Rio Brilhante.

Queremos que a Vossa Excelência antes de votar sobre o despejo da comunidade indígena Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS considere em primeiro lugar que as reservas/aldeias indígenas existentes no Cone Sul do atual Estado de Mato Grosso do Sul são superlotadas, onde não há mais espaço, infraestrutura e recursos naturais para sobreviver como povo Guarani-Kaiowá. Nas margens da rodovia há diversos perigos de vida onde já foram atropelados e mortos 5 indígenas de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS.

Importa considerar que no pequeno espaço do território tradicional de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS são encontradas fundamentais fontes de água (minas d’água, córregos, rios, etc.), que é o que permite e garante a vida boa da comunidade indígena Guarani-Kaiowá, onde estão se recuperando de todas violências sofridas.

Atenciosamente,                                                                                      
Aty Guasu- Jaguapiré-Tacuru, 03 de março de 2012
Lideranças da Aty Guasu do povo Guarani-Kaiowá do MS.

Carta da Aty Guasu enviada ao desembargador da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª TRF/SP


Grande assembleia Aty Guasu Guarani-Kaiowá-MS, 03 de março de 2012
À 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Ref.: Agravo de Instrumento n. 0026974-69.2001.4.03.0000/MS- 2011.03.00026974-4/MS
Excelentíssimo Senhor Desembargador da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Meritíssimo ANTONIO CARLOS CEDENHO,

Nós lideranças Guarani-Kaiowá da grande assembleia Aty Guasu vimos por meio desta apresentar a situação mísera, perplexa e instável permanente de vida de (trinta mil)30.000 Guarani-Kaiowá expulsos dos territórios tradicionais que se encontram em oito (08) Postos Indígenas/aldeias superlotadas criada entre 1915 e 1928 pelo órgão indigenista Serviço de Proteção aos Índios (SPI). Há 15 mil Guarani-Kaiowá despejados das terras antigas que estão dispersos nas pequenas áreas/acampamentos em conflito, nas margens das rodovias BR e nas periferias das cidades do Cone Sul de MS. De fato, a vida mísera e instável, assassinatos, suicídios e desnutrição que atingem a nova geração Guarani e Kaiowá são o resultado direto de violentas expulsões dos indígenas dos territórios antigos praticadas por pistoleiros das fazendas do atual Cone Sul de MS ao longo das décadas de 1970 e 1980.

Observamos que desde 1990 as ordens de perversos despejos das comunidades Guarani-Kaiowá são promovidas pela primeira instância da Justiça Federal do Mato Grosso do Sul.

Assim, a continuidade de nossa miséria, sofrimento, instabilidade e dispersão cruel de nossas famílias, a tentativa de desligamento de nosso território continua sendo efetuado pela própria Justiça Federal do Mato Grosso do Sul. Dessa forma, fomos levados às reservas/aldeias e margem da rodovia BR onde hoje não há mais espaço de terra para nós sobrevivermos.

Nestas reservas/aldeias não há mais espaço, recursos naturais, mina d’ água, são superlotadas e, por conta desta superlotação, há nelas muita violência. De fato, em decorrência desses vários despejos violentos já resultaram centenas de suicídios, mortes por desnutrição em todas as reservas/aldeias superlotadas. Nestas reservas e na margem da rodovia BR não há como praticar e preservar mais nosso modo de ser e viver Guarani-Kaiowá. Diante disso que muitas famílias Guarani-Kaiowá decidiram e tentaram retornar aos territórios antigos, ocupando pequenas parcelas de terra, com o objetivo de sobreviver culturalmente e para praticar os rituais religiosos e se afastar do mundo de violências das reservas/aldeias superlotadas. Como exemplo temos: As comunidades de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhantes-MS, Takuará-Juti, Kurusu Amba-Cel Sapucaia, Guaiviry-Aral Moreira, Guyra Roka-Caarapó entre outros. Nestes pequenos espaços reocupados por famílias extensas Guarani-Kaiowá, em que ocorre diariamente a prática de rituais religiosos e profanos, os grupos recomeçaram revitalizar as culturas tradicionais que garantem a boa vida futura. Isto não é mais possível nas reservas/aldeias onde as famílias foram sempre despejadas. 

Em geral a ordem de despejo das comunidades Guarani-Kaiowá dos territórios conseguido pelos fazendeiros através da Justiça Federal, em certa medida é a continuidade da expulsão drástica e perversa praticada comumente pelos pistoleiros das fazendas nos anos de 1970. Já vivemos e sentimos que as consequências das ações de despejos tanto pelos pistoleiros das fazendas, quanto pela Justiça, os resultados foram, são e serão extremamente truculentos e nocivos para a nova geração Guarani-Kaiowá.  

Assim, destacamos que a ordem da Justiça Federal em Dourados-MS para despejar através de força policial a comunidade Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu, composta também por crianças, mulheres e idosos, faz parte de um processo sistemático de etnocídio/genocídio, devido a uma história de violências contra povos indígenas brasileiros, alimentando o extermínio total do povo Guarani-Kaiowá do Cone Sul de Mato Grosso do Sul.
Ressaltamos que nos Guarani e Kaiowá temos uma ligação especial com o território, pertencemos à determinada terra. Assim, a terra ocupada por nossos recentes antepassados é vista por nós como uma fundamentação de vida boa, vida em paz, sobretudo é a fonte primária de saúde, bem estar da comunidade e famílias indígenas.  Dessa forma, o nosso território antigo é vital para nossa sobrevivência e desenvolvimento de atividades culturais que permitem a vida boa como um forte sentimento religioso de pertencimento à terra antiga, fundamentada em termos cosmológicos, sob a compreensão de que nos Guarani-Kaiowá fomos destinados, em nossa origem, como humanidade, a viver e a cuidar deste específico território antigo.

Diante disso, vimos através desta carta apresentar os nossos pedidos a Vossa Excelência. Nosso povo Guarani-Kaiowá quer sobreviver fisicamente e culturalmente como povo originário do Brasil. Não queremos ser extintos pela própria ação e mando da Justiça do Brasil. Como primeiro povo indígena do Brasil, queremos ser protegidos pela Justiça brasileira. Não queremos ver mais os nossos parentes serem expulsos dos pequenos espaços em seus territórios tradicionais, aumentando e alimentando mais violências contra o povo Guarani-Kaiowá. Por essa razão, nós lideranças da assembleia do Aty Guasu do povo Guarani Kaiowá do MS solicitamos a permanência da comunidade Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS no pequeno espaço antigo em que está reiniciando uma boa vida, onde está realizando os rituais vitais do povo Guarani-Kaiowá. Além disso, solicitamos a conclusão imediata do relatório antropológico de identificação do território Laranjeira Ñanderu-Rio Brilhante-MS. Visto que esta área é de ocupação tradicional Guarani-Kaiowá, é integrante das terras antigas situadas na bacia do Rio Brilhante.

Queremos que a Vossa Excelência antes de votar sobre o despejo da comunidade indígena Guarani-Kaiowá de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS considere em primeiro lugar que as reservas/aldeias indígenas existentes no Cone Sul do atual Estado de Mato Grosso do Sul são superlotadas, onde não há mais espaço, infraestrutura e recursos naturais para sobreviver como povo Guarani-Kaiowá. Nas margens da rodovia há diversos perigos de vida onde já foram atropelados e mortos 5 indígenas de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS.

Importa considerar que no pequeno espaço do território tradicional de Laranjeira Ñanderu -Rio Brilhante-MS são encontradas fundamentais fontes de água (minas d’água, córregos, rios, etc.), que é o que permite e garante a vida boa da comunidade indígena Guarani-Kaiowá, onde estão se recuperando de todas violências sofridas.

Atenciosamente,                                                                                      
Aty Guasu- Jaguapiré-Tacuru, 03 de março de 2012
Lideranças da Aty Guasu do povo Guarani-Kaiowá do MS.

Relatório da Aty Guasu Guarani-Kaiowá divulgado no dia 03 de março de 2012


Relatório do conselho da Aty Guasu
Nós Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul, reunidos em mais uma Grande Assembléia, Aty Guasu, na Terra Indígena Jaguapiré, município de Tacuru, do dia 29 de fevereiro a 3 de março, para celebrar as nossas lutas, prestar nossa homenagem e nos manifestar sobre as centenas de lideranças que tombaram na luta pela terra e pelos nossos direitos.

Lembramos com muita dor, respeito e carinho nosso líder religioso Nisio Gomes, assassinado recentemente num brutal ataque a seu acampamento no tekohá  Guaivyri. Com um minuto de silencio prestamos nossa homenagem a todos os guerreiros do nosso povo que derramaram seu sangue por nossas vidas. Hoje celebramos suas memórias, renovando a esperança e alimentando a certeza da vitória, na luta pela terra, autonomia, paz e liberdade como conquistas de nossas lideranças assassinados.

Com muita alegria sentimos que sempre mais gente vem nos apoiando e trazendo  solidariedade as nossas Aty Guasu. Contamos com a presença da desembargadora Kenarik, da Associação dos Juízes para a Democracia, Michael, advogada de São Paulo, Mario Rivarola vice-presidente do Conselho Continental Guarani,  que é um parente nosso do Paraguai, além dos nossos parentes Terena e amigos de várias entidades de apoio. Também vieram ouvir nossas exigências e apelos, representantes de vários órgãos do governo como Paulo Maldos, Secretaria da presidência da República, Thiago Garcia, Cilene e Érica da Funai de Brasília, Fabiana dos Direitos Sociais, Isabela, do Ministério da Educação, Dario- coordenador do Teko Arandu, Procurador Marco Antonio- Ministério Público Federal de Dourados, Fabio Mura- antropólogo, representando a Associação Brasileira de Antropologia, Vários diretores das nossas escolas, vereadores indígenas,  dentre outros. Também tivemos a segurança com a presença da Força Nacional e Polícia Federal.

Num primeiro momento fizemos a memória das nossas lutas nos últimos trinta e cinco  anos, desde   que  iniciamos a luta de recuperação de nossos territórios, na década de setenta. Os anciões, guerreiros e lutadores desde as primeiras reuniões e planejamento de retomadas de nossas terras foram contando o  quanto foi difícil cada tekohá retomado, as expulsões pelos pistoleiros, policia e Funai algumas vezes. Cada palmo de terra reconquistado foi uma batalha, cada tekohá retomado foi uma luta de muitos anos.  E o que deu essa força, inclusive para que não fossem assassinadas nossas lideranças, foi a presença forte e essencial dos Nhanderu e Nhandesi . Eles garantiram as vitórias no chão, na retomada. É essa prática que estamos buscando retomar, colocando os Nhanderu em primeiro lugar.

Já gastamos papel demais. Já fizemos ouvir nossa voz em várias partes do Brasil e do mundo. Por isso estamos decididos de avançar na conquista dos nossos direitos com nossas forças, união, organização, fortalecendo a Aty Guasu e o nosso Conselho da Aty Guasu, assim como os Conselhos das mulheres, dos jovens, dos nhanderu, dos professores e dos agentes de saúde. Juntos vamos conquistar o que para nós é sagrado, como nossa mãe terra e assim garantir o nosso jeito de viver e ser Guarani Kaiowá.

Reafirmamos nossas principais exigências e compromissos
  1. Continuaremos retomando nossos tekohá, nossas terras tradicionais, como único jeito de contribuir com o Estado brasileiro, para que ele pague sua dívida histórica, de muito sangue e sofrimento,  reconhecendo e demarcando nossas terras.
  2. Vamos dar mais 60 dias para que todos os relatórios de identificação de nossos territórios sejam publicados.  Não vamos esperar quietos, vamos esperar agindo, fazendo movimento, nos unindo e organizando cada vez mais.
  3. Que o governo federal inicie o mais rapidamente possível a indenização dos títulos que ele deu nas colônias agrícolas de Iguatemi, Sete Quedas e Dourados, e que  estão em terras indígenas já reconhecidos, como gesto concreto de vontade polícia de resolver a questão da  regularização de nossas terras.
  4. Que o governo não conceda mais empréstimos às propriedades e empresas que tem produção dentro das terras indígenas já reconhecidas.
  5. Pedimos que nas terras já reconhecidas como indígenas, os ocupantes não índios sejam retirados e nós possamos ocupá-las, enquanto os processos tramitarem na justiça. Que o Ministério Público batalhe por isso junto à justiça.
  6. Que a polícia federal e Guarda Nacional dêem segurança a nossas lideranças, ameaçadas, e a nossas comunidades, especialmente as que estão em situação de conflito, nas retomadas.
  7. Que os inquéritos sobre os assassinatos de nossas lideranças sejam concluídos com rapidez, os responsáveis  punidos, como único jeito  de acabar com a situação de impunidade existente.
  8. Exigimos dos órgãos competentes pelas políticas publica de saúde e educação, que  atendam e sejam mais sensíveis e responsáveis  com as demandas emergenciais que atingem os Guarani kaiowa.
  9. Que o governo, suas representações e instituições responsáveis pelas políticas para com os povos indígenas, se mantenham atentos às suas demandas especificas numa relação de construção conjunta onde os Guarani kaiowa sejam ouvidos e reconhecidos em sua autonomia e diversidade cultural.
  10. Exigimos das autoridades governamentais e não governamentais que reconheçam  nossos direitos garantidos na lei (Constituição Federal). Queremos ser tratadas de igual para igual. Que todos os direitos escritos no papel  sejam cumpridos, na educação, saúde e em termos da sociedade e da terra. Porque, cansamos  de ser enrolados, enganados e iludidos pelo governo federal.

Pedimos ao governo prioridade e urgência para os acampamentos indígenas, as áreas de conflito. Eles necessitam de atenção especial nas políticas de alimentação, segurança, saúde e educação.

Paulo Maldos repetiu “vocês já venceram”! Nós também temos essa certeza!  Porém  acreditamos que teremos que estar sempre mais unidos na luta, guiados pelos nossos Nhanderu e Nhandesi, com sempre mais amigos e apoiadores no Brasil e no mundo para ir dando passos que garantam essa vitória, da terra e da vida do nosso povo.

Aldeia Jaguapiré, 3 de março de 2012.

sábado, 3 de março de 2012

Desembargadora Kenarik Baujikian participou da Aty Guarani Kaiowá em Jaguapiré-Tacuru-MS


Lentidão da Justiça aumenta tensão entre índios e fazendeiros
03/03/2012

A lentidão da Justiça brasileira para finalizar os processos relacionados às homologações de terras indígenas colabora para aumentar o clima de tensão e violência em as áreas de conflito, em especial no estado de Mato Grosso do Sul. A avaliação foi feita pela desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo e uma das fundadoras da Associação de Juízes pela Democracia (AJD) Kenarik Baujikian.

Kenarik Baujikian é desembargadora do TJ/SP e uma das observadoras da Aty Guasu, assembleia do povo indígena Guarani-Kaiowá do MS - Divulgação

Uma das observadoras da Aty Guasu, uma grande assembleia do povo indígena Guarani-Kaiowá do estado de Mato Grosso do Sul, que ocorre no município de Tacuru até amanhã (3), a desembargadora acredita que devido à lentidão do Poder Judiciário tanto índios quanto fazendeiros e produtores rurais partem para o conflito a fim de defender seus direitos.

“O Judiciário brasileiro precisa saber dos reflexos do descumprimento da sua obrigação, que é fazer justiça. Nesse caso, acaba criando mais injustiça e isso é gravíssimo. É preciso ter consciência de que a falta de decisão está fomentando situações muito tristes que estamos vendo agora, especialmente em Mato Grosso do Sul”, disse Kenarik Baujikian.

Para a desembargadora, os processos de demarcação e homologação de terras indígenas não podem tramitar por anos nos tribunais sem que tenha uma definição. “A demora na solução acaba reforçando os problemas que existem de violência, tensões, seja dentro das comunidades indígenas, seja nas outras comunidades que estão em volta. O Judiciário tem cumprido um papel de reforçar [isso], na medida em que a questão da demarcação de vários processos está paralisada no Supremo Tribunal Federal”, argumentou.

“A demora da Justiça contribui para a violência e não só para isso como também para a instabilidade geral em todos os sentidos, inclusive, econômico dos envolvidos. A pior coisa que pode acontecer é não se resolver esse problema logo, seja por meio das homologações, seja pelas questões que já estão no Judiciário”, acrescentou a desembargadora.

Kenarik Baujikian também responsabilizou o Poder Executivo pela dificuldade em solucionar os problemas indígenas. “Não é só o Judiciário. O Executivo [tem responsabilidade] também porque existem atribuições próprias do Executivo e isso não tem sido realizado. Estamos muito atrasados em relação a isso e o que só vem reforçar a questão de incerteza, tensão para todas as pessoas envolvidas.”

Iniciada na quarta-feira (29), a primeira Aty Guasu de 2012 reúne cerca de 250 lideranças, que representam cerca de 45 mil índios das etnias Guarani-Kaiowá e Nhandéwa, de 26 municípios de Mato Grosso do Sul. Criada na década de 1970, Aty Guasu é parte da organização social e um movimento político-religioso do povo indígena Guarani-Kaiowá. Ao final do encontro, os índios divulgarão um documento com reivindicações e demandas que serão encaminhados às três esferas de Poder.

(Agência Brasil)